A Lição Inesquecível
Francisco Cândido Xavier
Pelo Espírito Neio Lúcio
Hilda, menina abastada, diariamente dirigia más palavras à pequena
vendedora de doces que
lhe batia humildemente à porta da casa.
— Que vergonha! De bandeja! de esquina a esquina! Vai-te daqui! —
gritava, sem razão.
A modesta menina se punha pálida e tremula.
Entrementes, a dona da casa, tentando educar a filha, vinha ao encontro
da pequena humilhada e dizia, bondosa:
— Que doces tão perfeitos! Quem os fez assim tão lindos?
A mocinha, reanimada, respondia, contente:
— Foi a mamãe.
A generosa senhora comprava sempre alguma coisa e, em seguida,
recomendava à filha:
- Hilda, não brinques com o destino. Nunca expulses o necessitado que
nos procura. Quem sabe o que sucederá amanhã? Aqueles que socorremos
serão provavelmente os nossos benfeitores.
A menina resmungava e, à noite, ao jantar, o pai secundava os
conselhos maternos, acrescentando:
- Não zombes de ninguém, minha filha! o trabalho, por mais humilde, é
sempre respeitável e edificante. Por certo, dolorosas necessidades impelirão
uma criança a vender doces, de porta em porta.
Hilda, contudo, no dia seguinte, fustigava a vendedora, exclamando:
- Fora daqui! Bruxa! bruxa!...
A mãe devotada acolhia a pequena descalça e repetia à filha as
advertências carinhosas da véspera.
Correu o tempo e, depois de quatro anos, o quadro da vida se
modificara.
O paizinho de Hilda adoeceu e debalde os médicos procuraram salvá-lo.
Morreu numa tarde calma, deixando o lar vazio.
A viúva recolheu-se ao leito extremamente abatida e, com as despesas
enormes, em breve a pobreza e o desconforto invadiram-lhe a residência. A
pobre senhora mal podia mover-se.
Privações chegaram em bando. A menina, anteriormente abastada, não
podia agora comprar nem mesmo um par de sapatos.
Aflita por resolver a angustiosa situação, certa noite Hilda chorou
muitíssimo, lembrando-se do papai. Dormiu, lacrimosa, e sonhou que ele vinha
do Céu confortá-la. Ouviu-o dizer, perfeitamente:
- Não desanimes, minha filha! vai trabalhar! Vende doces para auxiliar a
mamãe!...
Despertou, no dia imediato, com o propósito firme de seguir o conselho.
Ajudou a mãezinha enferma a fazer muitos quadrinhos de doce de leite
e, logo após, saiu a vendê-los. Algumas pessoas generosas compravam-nos
com evidente intuito de auxiliá-la; entretanto, outras criaturas, principalmente
meninos perversos, gritavam-lhe aos ouvidos:
- Sai daqui! Bruxa de bandeja!...
Sentia-se triste e desalentada, quando bateu à porta de uma casa
modesta. Graciosa jovem atendeu.
Ah! que surpresa! era a menina pobre que costumava vender cocadas
noutro tempo. Estava crescidinha, bem vestida e bonita.
Hilda esperou que ela a maltratasse por vingança, mas a jovem humilde
fitou nela os grandes olhos, reconheceu-a, compreendeu-lhe a nova situação e
exclamou, contente:
- Que doces tão perfeitos! Quem os fez assim tão lindos?
A interpelada lembrou os ensinamentos maternos de anos passados e
informou:
- Foi a mamãe.
A ex-vendedora comprou quantos quadrinhos restavam na bandeja e
abraçou-a com sincera amizade.
Desse dia em diante, a menina vaidosa transformou-se para sempre. A
experiência lhe dera inesquecível lição.
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